A autorregulação é um aspeto fundamental do desenvolvimento infantil, influenciando a forma como as crianças interagem com o mundo à sua volta. Quando existem dificuldades no processamento sensorial, podem surgir desafios na autorregulação.
É por isso importante estar atento a sinais de alerta, que podem manifestar-se através de baixa reação a vários estímulos, agitação exacerbada, dificuldades em manter a atenção ou reações intensas a estímulos do dia a dia. Neste artigo, exploramos os principais sinais de alerta nos domínios comportamental, motor, social e cognitivo, como forma de ajudar os pais a reconhecerem possíveis dificuldades na autorregulação e a procurar as melhores estratégias de intervenção.
O que é a autorregulação?
A autorregulação é uma competência complexa que envolve diversas variáveis e componentes. Diz respeito à capacidade de integrar e processar as informações provenientes dos sentidos, permitindo ajustar as respostas motoras, emocionais e comportamentais. Esta competência ajuda a manter um equilíbrio entre estados de alerta e relaxamento, contribuindo para uma melhor concentração, interação com o ambiente e participação em atividades diárias.
É importante lembrar que todas as crianças têm as suas próprias estratégias e técnicas únicas de autorregulação que funcionam melhor para elas. Estas estratégias e abordagens podem variar consoante o temperamento, a personalidade, as necessidades de processamento sensorial, a neurodivergência, a exposição a traumas, os atrasos no desenvolvimento e outros aspetos individuais.
Como identificar dificuldades de autorregulação? Sinais de alerta
Identificar os sinais da desregulação ajudará a compreender e apoiar crianças que enfrentam dificuldades no processamento sensorial. A intervenção precoce, especialmente através da terapia ocupacional pediátrica na vertente de integração sensorial, pode ajudar a desenvolver estratégias de autorregulação e melhorar significativamente o desenvolvimento global da criança.
Principais sinais de alerta que podem indicar que a criança necessita de ajuda para desenvolver as suas competências autorregulatórias:
Comportamento
- Age de forma excessivamente “pateta” ou fora de controlo;
- Birras frequentes e difíceis de resolver;
- Dificuldade nas transições entre atividades ou entre espaços;
- Dificuldade em esperar;
- Demonstra comportamentos físicos (bate, atira objetos, etc.) quando está aborrecido.
Expressão motora
- Dificuldade em caminhar em fila com os colegas;
- Agitação motora, dificuldade em permanecer até ao término das tarefas;
- Dificuldade em regular a força e a velocidade dos movimentos;
- Cai frequentemente ou esbarra em objetos ou noutras pessoas;
- Letargia, sonolência excessiva, pouca reação.
Sócio-emocional
- Tem dificuldade em esperar a sua vez e em partilhar;
- Fala alto demais, aproxima-se demasiado ou toca nos outros;
- Não percebe ou identifica as emoções, seja nas suas ou nas dos outros;
- Tem dificuldade em atividades que envolvem equipas, regras, ganhar ou perder;
- Dificuldade em entrar nas brincadeiras dos amigos.
Funções executivas e planeamento
- Tem dificuldade em gerir o tempo e em planear;
- Demonstra inflexibilidade ou rigidez em relação aos planos, rotinas e comportamentos;
- Não pede ajuda durante atividades desafiantes ou pede ajuda antes de tentar realizar tarefas de forma independente;
- Tem dificuldade em seguir e executar instruções compostas por várias etapas.
Intervenção: porque razão é importante?
Lidar com a desregulação de uma criança pode ser um desafio, mas existem diversas estratégias que podem aliviar significativamente o desconforto e o stress associados a estes momentos. Uma intervenção adequada e a implementação de estratégias pode ser fundamental. Pausas para atividades sensoriais, espaços tranquilos e ferramentas visuais, como calendários e pictogramas, ajudam as crianças a gerir o seu dia com mais eficácia e a evitar sobrecargas sensoriais.
Profissionais como terapeutas ocupacionais especializados em integração sensorial, ajudam não só na aplicação de intervenções individualizadas, mas também na orientação dos pais para adaptarem as suas rotinas, para que sejam mais funcionais e ajustadas às necessidades sensoriais de cada criança.
A intervenção em integração sensorial, realizada por terapeutas ocupacionais especializados, é fundamental para trabalhar dificuldades de autorregulação em crianças. Esta abordagem terapêutica envolve atividades lúdicas que expõem a criança a estímulos sensoriais controlados, visando melhorar a capacidade de processar e responder adequadamente a informações sensoriais. Com o tempo, a terapia promove uma melhor autorregulação, atenção e participação em atividades diárias, resultando em respostas mais adaptativas e funcionais.
Quando procurar apoio?
É importante estar atento a certos sinais que podem indicar desafios na autorregulação infantil. Se uma criança apresenta agitação excessiva, crises frequentes, dificuldades em lidar com mudanças, agressividade ou ansiedade intensa, pode estar a enfrentar dificuldades regulatórias. Além disso, problemas como tropeçar com frequência, falta de noção do espaço corporal, dificuldades em interagir socialmente ou respeitar limites também podem ser sinais de alerta. No dia a dia, comportamentos como rigidez em rotinas, frustração fácil, dificuldade em seguir instruções e problemas de planeamento podem afetar o desenvolvimento. Se estes desafios forem persistentes, procurar apoio profissional pode fazer toda a diferença.
A autorregulação permite às crianças aplicar e desenvolver competências motoras, linguísticas e cognitivas de forma equilibrada. Para isso, é fundamental identificar sinais de desregulação sensorial, compreender os seus gatilhos e desenvolver competências regulatórias. Com paciência, conhecimento e empatia, os pais podem ajudar os filhos a desenvolver resiliência, independência e autoconfiança, permitindo-lhes lidar melhor com os desafios do dia a dia.
Breve glossário:
Autorregulação: é a capacidade de uma criança de controlar as suas respostas emocionais, comportamentais e motoras, ajustando-se adequadamente ao ambiente e às situações diárias.
Desregulação sensorial: dificuldades que uma criança pode ter em processar e responder adequadamente aos estímulos sensoriais, o que pode afetar o seu comportamento e a sua interação com o ambiente.
Integração sensorial: abordagem terapêutica utilizada para ajudar as crianças a processar estímulos sensoriais de forma mais eficaz, promovendo uma melhor autorregulação.
Funções executivas: conjunto de habilidades cognitivas responsáveis pelo planeamento, organização, tomada de decisões e controlo de impulsos, fundamentais para o desenvolvimento da autorregulação.
Neurodivergência refere-se a um termo amplo que descreve condições neurológicas e psicológicas em que o desenvolvimento cerebral de uma pessoa difere da norma estabelecida pela sociedade. Isso inclui condições como o autismo, TDAH (transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), dislexia, entre outras. As pessoas neurodivergentes têm uma forma única de processar informações, reagir a estímulos e interagir com o mundo.